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Uma hora para fazer, dez minutos para comer, meia hora para lavar.

Adoro cozinhar. Cozinho desde os oito anos, forçando a barra para ocupar meu lugar no fogão. Venci a resistência de minha mãe, que achava que eu ia morrer queimada. Fugia para a casa da minha avó, que desconhecia a proibição e me ensinava o básico.


Quando minha mãe descobriu que eu já sabia fazer o arroz, o feijão, o trivial do dia a dia e, melhor ainda, estava inteira e bem viva, entregou-me as panelas com enorme alívio. Daquele momento em diante, virei cozinheira da casa e, até o último dia em que tive esse privilégio, fiz para minha mãe as comidas de que ela mais gostava e que me pedia, sem o menor constrangimento.


No dia em que contei isso para minha amiga, a Betinha, ela rebateu: "Detesto cozinhar. Uma hora para fazer, dez minutos para comer e meia hora para lavar."


Matematicamente, Betinha está certíssima. Parece que não compensa. Mas a diferença entre nós é que eu gosto do processo. Eu gosto, justamente, é daquela "uma hora para fazer". Não é sobre se ter a comida, é sobre conduzi-la por um percurso de transformação, de aromas e temperaturas, cores, texturas e formatos. É entrar nesse universo e ficar lá pela abençoada hora, longe do outro universo em que habito, pensando diferente, dialogando sem palavras com elementos que nem são humanos, num idioma de aromas e temperaturas, cores, texturas e formatos.



Sempre me volta esse diálogo entre mim e a Betinha quando penso na distinção entre se ter uma mentalidade fixa ou uma de crescimento. Embora eu tenha sido extremamente forjada com o aço da mentalidade fixa, como todo o mundo que passou pela escola, essa mentalidade jamais teve permissão para entrar na minha cozinha.


Práticas que não deram certo me desafiaram a encontrar outro caminho, pratos que eu quis fazer sem ter a receita me desafiaram a tentar, técnicas que não faziam parte do meu repertório me desafiaram a aprender, ingredientes que eu nunca tinha cozinhado me desafiaram a pesquisar... Cada prato que eu coloquei na mesa trouxe, além dos ingredientes que o compunham, curiosidade, esforço, empenho, teimosia, treino, estratégia, aprendizado, erros, hipóteses testadas, teorias naufragadas, criatividade, fracassos, descobertas casuais... enfim, uma lista inesgotável de ganhos adicionais. Cada prato trouxe em si o caminho que percorri fazendo todos os outros pratos e tudo o que eu aprendi enquanto caminhava.


Carol Dweck, que cunhou as definições de mentalidade fixa e de crescimento, no conhecido Mindset, diz que a mentalidade de crescimento pode ser aprendida. Independentemente da idade do aprendiz, ou seja, nunca é tarde para se deixar um pouco o produto de lado e passar a se divertir com o processo.


Preciso compartilhar isso com a Betinha.




 
 
 

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